A internet está (mais uma vez) discutindo os limites do humor. Tudo porque, nesta semana, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que o comediante Léo Lins retirasse do YouTube seu show de stand-up Perturbador, no ar desde dezembro. O conteúdo já tinha mais de 3 milhões de visualizações.
A Justiça acatou o pedido do Ministério Público que considerou as “piadas” feitas na apresentação impróprias, uma vez que zombavam de minorias, deficientes físicos, pessoas idosas e religiões.
No último sábado (13), Léo Lins comunicou nas redes sociais que o show seria apagado e disse: “Faltam 180 minutos para abrir um precedente perigoso para a comédia, ou melhor, a arte em geral”. O comediante diz estar sendo vítima de censura e que o “processo é surreal”.
A história ganhou ainda mais força quando Fábio Porchat saiu em defesa do colega de profissão, que acumula processos por causa de suas “piadas” preconceituosas.
Recentemente, por exemplo, Lins foi obrigado a pagar indenização à família de uma criança com hidrocefalia, que acabou inspirando algumas falas do comediante em um stand-up. Ele dizia assim: “Eu acho muito legal o Teleton, porque eles ajudam crianças com vários tipos de problema. Vi um vídeo de um garoto no interior do Ceará com hidrocefalia. O lado bom é que o único lugar na cidade onde tem água é a cabeça dele. A família nem mandou tirar, instalou um poço. Agora o pai puxa a água do filho e estão todos felizes”. O vídeo também foi retirado do ar.
A respeito do show Perturbador, Porchat se posicionou contrário à decisão da Justiça nas redes sociais. “Não gosta de uma piada? Não consuma essa piada. Se a piada não incitou o ódio e a violência ela é só uma piada. Tem piada de todos os tipos, de pum e de trocadilho, ácida e bobinha. Tem piada de mau gosto? Tem também. Tem piada agressiva? Opa. Mas aí é só não assistir“, escreveu.
O comediante, que tem um programa no GNT, disse ainda que não há nenhum problema legal em fazer piadas com minorias: “Dentro da lei pode-se fazer piada com tudo(…) Não gostar de uma piada não te dá o direito de impedir ela de existir”.
Em seu discurso, Porchat concordou que, de alguma forma, Lins estava sendo censurado: “Não existe censura do bem. Se cada pessoa que se ofender com uma piada resolver tirar ela do ar não sobra um Joãozinho, um papagaio, um argentino. Pra mim democracia não é um regime pra você defender as suas ideias, mas pra quem você não concorda poder defender as delas”.
Não demorou muito para a postagem de Porchat começar a receber críticas nas redes sociais, de famosos e anônimos. O advogado e criador de conteúdo Guilherme Macedo, conhecido nas redes como “Advoafro”, explicou que, quando o racismo vem disfarçado de “piada”, um crime está, sim, sendo cometido.
No stand-up, Léo Lins dizia que hoje “negro não consegue achar emprego, mas que na época da escravidão nascia já empregado”.
Outras pessoas aproveitaram a oportunidade para esclarecer que a PL das Fake News não é sobre censura, uma vez que muita gente estava usando o exemplo do comediante para propagar notícias falsas sobre o projeto de lei que pretende criar uma regulamentação para a internet.
Quem também teve o nome envolvido na polêmica foi o humorista Paulo Vieira, que apresentou um quadro no BBB23. Ele, um comediante negro, disse que entrou no Twitter e viu seu nome nos assuntos mais comentados, pois a galera estava pedindo um posicionamento dele. Vieira se sentiu incomodado com a pressão e apontou um caso de racismo estrutural nela: “Acho muito difícil que se fosse ao contrário isso também acontecesse”.
Vieira ainda falou que episódios do tipo o fazem sentir como se ele estivesse sempre à prova, uma coisa meio tudo ou nada. “Ou ele atende as expectativas, ou é exatamente o que eu achava, pois esse daí nunca me enganou(…) Vocês não sabem como é horrorosa essa sensação de conquistar, conquistar e não ter nada”, lamentou.
O processo envolvendo o show retirado de Léo Lins corre em segredo de Justiça e o comediante pode ainda recorrer – mas, por ora, o show está fora do ar.
Tags:Fabio Porchat, Leo Lins, LGBTQIA+, Paulo Vieira, Racismo Last modified: 18 de maio de 2023